quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Página aberta de adulta aberta

A minha criança é bem espontânea e às vezes se mete nas minhas conversas de adulto. A minha criança se lambuza e se joga no que e quando sente vontade. A minha criança tem uma imaginação da gota, e uma capacidade criativa que encanta a minha adulta. A minha adulta às vezes gosta de se inspirar na minha criança. A minha criança diz que quer ser que nem a adulta quando crescer. A minha criança não tem medo que quem leia isso as ache (ela e a minha adulta) esquizofrênicas. A minha adulta tá pensando seriamente em apagar. Em não publicar, pelo menos. Mas a criança insiste, arregala os olhinhos contentes e doces e derrete a adultez da adulta. Ela faz muito isso: adultera os fatos quando precisa e as precisões quando não dá para adulterar os fatos. A minha criança é esperta, nem parece ter a idade que tem. A minha criança não tem idade, ou é a adulta que fica escondendo? A minha criança bagunça tudo quando vai brincar, e bota tudo no lugar quando a adulta pede, mas se percebe ela distraída, muda alguma coisa discretamente. A adulta chama esses momentos de “crise existencial”, a minha criança não sabe o que isso quer dizer, mas se orgulha de ter causado uma palavra tão bonita. Palavras bonitas deixam minha criança abestalhada, inventar sentidos é uma de suas brincadeiras preferidas, nessas horas ela e a adulta sentam no chão e brincam juntas. Tão juntas que quem vê nem sabe quem é quem. A adulta gosta de planejar, precaver, controlar; a criança segue o que consegue e ousa na maioria das vezes. A criança tem dúvidas e pergunta a adulta, que esclarecida que é, responde direitinho. Nessas horas a criança quer ser adulta, e a adulta gosta de ser adulta. Isso acontece também quando a adulta usa louça, vidro, alcança objetos em prateleiras altas... Mas eu gosto mesmo quando as duas se encontram, se companherizam e se ajudam. A minha adulta é meio nostálgica mas às vezes consegue gostar de ser adulta, sobretudo quando entende que isso não quer dizer o oposto de ser criança. Minha criança não entende nada disso, “oposto” para ela é o lugar em que se bota gasolina no carro. Ela gosta da adulta porque gosta e pronto. É bem filosófica a minha criança, mas quando a adulta lhe sugere ir brincar, ela vai. A adulta aproveita para ir junto. Minha criança gosta, se sente segura, mas gosta também de correr, e se esconder um pouquinho. Às vezes é engraçado ver a adulta irritada. Engraçado também é quando a adulta brinca muito e fala de uma tal de ludicidade, a criança não sabe o que é, mas sabe que é uma coisa que a adulta gosta muito. A adulta vai adultescendo, a criança benjaminbuttando. A minha criança faz perguntas em público, que ora constragem a minha adulta, ora a deixam orgulhosa e alividada “que bom que ela perguntou!”. A minha criança viu a minha página do facebook aberta e começou a escrever, a adulta gostou muito, tentou mas não conseguiu não ajeitar umas vírgulas e uns erros de português, ia reler pra ajeitar mais, mas a minha criança pediu pra ela postar logo que ela queria ir brincar e elas foram brincar antes mesmo de digitar o ponto final